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LOST RECORDS – Fita 2: queria ter gostado mais

Finalmente joguei a Fita 2 (Rage) de Lost Records, meus amigos. E o que o título deste texto já adianta é: o doce da nostalgia deixou um gostinho amargo na minha boca.

Mas vamos por partes.

⚠️ Atenção: daqui pra baixo é uma mina de spoilers do game. Se você ainda não jogou e prefere evitar revelações sobre a trama, pare agora meixmo.

A Fita 1 (Bloom) termina com a revelação de que a Kat tem leucemia em estágio terminal. O que não é só um ponto de virada emocional, mas o gatilho que coloca à prova as costuras da amizade entre as quatro meninas.

Na real, foi como imaginei depois de jogar a fita anterior: se em Bloom foi um crescimento emocional positivo, em Rage seria o momento em que as inseguranças retornam. Enquanto na Fita 1 o vínculo entre elas parecia sólido, juvenil e quase indestrutível, aqui ele começa a revelar algumas rachaduras que vêm do medo, da culpa e, um pouco, da incapacidade de lidar com a dor das pessoas.

Swann, como sempre, ocupa uma posição quase instintiva de mediação. Mas dessa vez o peso que ela carrega é mais denso. Saber da doença de Kat muda a maneira como ela observa e reage ao grupo. Há uma urgência nova nos seus gestos, um cuidado redobrado e, ao mesmo tempo, um afastamento sutil, como se ela própria ainda estivesse tentando digerir tudo antes de saber como agir.

Pelo menos na minha gameplay, essa mudança afetou muito mais intensamente a dinâmica com a Autumn. Ela oscila entre o colapso iminente diante da situação e a tentativa de manter uma fachada, e é nesse ponto que o jogo oferece uma das sequências mais marcantes da Fita 2: quando Autumn tem um ataque de pânico e Swann precisa trazê-la de volta pro chão da realidade.

Ou melhor, pra dentro de tudo o que construíram naquela amizade.

 

A fragilidade das (minhas) conexões

Ainda que a tal sequência das duas seja, de fato, marcante, foi uma das que mais me fizeram questionar meu envolvimento emocional com a Autumn.

São cenas construídas com sensibilidade, que deixam espaço pras emoções respirarem. Autumn volta à cabana pra pegar de volta suas coisas e ir pra casa, cheia de culpa por ter convivido tanto tempo com a Kat sem saber da doença, crente de que o show que fizeram no estacionamento do bar foi um completo desastre pra todos (mas especialmente pra ela, que foi parar no hospital logo depois).

Além disso, Autumn afirma que sempre se sentiu deixada de lado no grupo. Ela era a pessoa, entre as meninas, em quem menos prestavam atenção, por quem menos se importavam.

Isso me causou estranhamento, enquanto jogadora, porque não senti essas pistas sendo jogadas na Fita 1 pra gente colher a “recompensa” depois.

Então, quase pus tudo a perder ali: eu estava diante de uma personagem em crise e, ainda assim, hesitei em me esforçar pra vê-la bem.  Tive, inclusive, que rejogar a cena, porque 1) eu de fato não me importei muito e 2) porque a narrativa não me deu as ferramentas emocionais para saber como estar ali por ela.

Claro que é parte reflexo das escolhas que o jogo me permite fazer e da forma como ele estrutura esses relacionamentos, mas creio que também possa ser culpa do roteiro. Nunca senti que havia solo fértil o suficiente para a relação florescer com a Autumn, não da mesma forma que com a Kat.

Com Kat, a conexão é imediata, orgânica, eu diria quase inevitável. Existe algo entre ela e Swann que transborda. Já com Autumn (e, em menor grau, com Nora), tudo parece mais protocolar. As interações soam menos naturais, como se o jogo me dissesse: “Você deveria se importar com ela”, mas não me desse material suficiente para que isso de fato acontecesse.

De toda forma, ponto pra Lost Records na sutileza certeira de mostrar como uma experiência de trauma compartilhado pode não necessariamente unir; às vezes, ela separa.

Afinal, nem todo mundo sabe o que fazer com a dor do outro.

 

Kat: o laço mais forte de Lost Records

Se tem uma personagem que Lost Records: Bloom & Rage constrói com um cuidado quase visceral, essa personagem é a Kat.

Comentei no texto sobre a Fita 1 que ela já se destacava com sua energia impulsiva, seu jeito afiado de ver o mundo, sua coragem camuflada de rebeldia. Mas é na Fita 2 que a gente realmente se aproxima dela.

Sim, você está pensando na cena do corte de cabelo, que eu sei.

Quando Kat pede para Swann cortar seu cabelo, o jogo pausa. Não no sentido literal, claro, mas emocional. Tudo desacelera. Não tem música dramática, nenhuma revelação bombástica. Só duas pessoas dividindo um momento íntimo, sutil, carregado de afeto, de um pedido de suporte, de presença.  “Me veja como eu sou agora. Fique comigo”.

É impossível não sentir o peso disso. A tesoura cortando as mechas vira uma espécie de luto antecipado, e a gente, do outro lado da tela, consegue pensar em tudo o que nunca vai ser dito, tudo o que vai ficar pelo caminho. Mas a Kat sabe. E provavelmente a Swann também.

Sem brincadeira, só de escrever estou chorando (de novo).

 

O abismo e a frustração de não chegar a lugar nenhum

Desde a Fita 1, o tal “abismo” paira sobre Lost Records como uma promessa de mistério, como uma figura quase mitológica no universo daquelas garotas. É um espaço físico, mas também emocional.

Na Fita 2, a expectativa era de que fôssemos, enfim, encarar esse abismo de frente e revelassem o que ele, de fato, é.  Ou, ao menos, um fechamento simbólico para o que aquelas personagens atravessaram.

Em vez disso, ele se torna ainda mais nebuloso. Novos elementos surgem, pistas são deixadas, até mesmo com um reforço da minha teoria de diferentes realidades. Mas nada é confirmado, nada é desvendado, simplesmente porque está claro que a história de Lost Records não vai terminar na Fita 2.

Eu sei que Lost Records, no fim das contas, ser uma série, é motivo pra comemorar. Fiquei feliz em saber que há uma boa chance da Kat não ter morrido pela doença, mas, de alguma forma, ter ficado presa no abismo. Afinal, Kat é o fio que me manteve conectada ao jogo, e saber que ainda há algo dela por vir é um conforto estranho.

Mas também fiquei bem frustrada. Pra aproveitar a analogia: a sensação é de que o jogo nos conduziu com firmeza até a beira do precipício… para então recuar e nos deixar ali, sozinhos, olhando pro nada.

A decepção não vem só da ausência de respostas, mas da quebra de uma expectativa. Achei meio anticlimático: “Isso é tudo… por enquanto”.

Vou continuar nessa jornada, apesar dos pesares, quando a próxima Fita for lançada. Justamente, talvez, porque estou mais instigada não pelo que o jogo mostrou até agora, mas pelo que ele promete mostrar!

 

Um final solitário

Não ficarei surpresa se me disserem que meu final foi o “pior”: Nora e Autumn foram embora do bar, deixando Swann sozinha com a caixa misteriosa da Kat.

Ainda assim, não senti que foi um “desfecho” ruim. Pelo contrário: há algo bonito e sereno nessa solidão escolhida, nesse momento em que Swann se permite parar e revisitar tudo o que viveu.

Achei bem bonita a sequência em que ela caminha pela floresta e reencontra as versões mais novas de si mesma e das amigas. Uma despedida melancólica, mas também um reencontro íntimo, quase espiritual.

Ver a Swann adulta mostrando seu rosto, enfim, fecha um arco que começou com vergonha e apagamento (a tal referência ao patinho feio que mencionei na resenha da Fita 1). Agora, ela se vê. Se reconhece. E nos permite vê-la também.

Mas, no fundo, eu queria ter fechado a caixa junto com a Swann, e não deixá-la meio aberta.

A Fita 2 é bonita, sim, sem dúvidas. Sensível, também. Só não atingiu minhas expectativas e não me deu tudo o que eu queria, mas já aceitei que ainda há caminho pela frente, mesmo sem saber exatamente onde ele leva.

Que venha a Fita 3!

Nota:

Estrela Estrela Estrela

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