Bem, amigos da Rede Glóbo, enfim chegamos ao último episódio do jogo prelúdio de Life is Strange, lançado ontem globalmente para Playstation 4, Xbox One e Steam (PC). Já aviso que esse texto contém spoilers e, se você ainda não leu meu post sobre o episódio anterior, sugiro que o faça - principalmente se está decepcionado como eu.
Na última linha, eu faço uma pergunta: "Será que vou pagar língua?". Enumerei vários pontos críticos ao desenvolvimento da história, ao fanservice e ao potencial das supostas metáforas que o jogo estava mostrando. E, agora, com tudo concluído, minha resposta é: "não, não paguei". Infelizmente.
Se os dois primeiros episódios de Life is Strange - Before the Storm estavam demasiadamente centrados em amberprice service e na rápida evolução da relação entre Chloe e Rachel, Inferno vazio condensa (quase) todas as revelações da história do prelúdio. Isso me leva a uma desaprovação sob dois aspectos: 1) Deixou o episódio apressado e mal amarrado e 2) Inicialmente haveria mais momentos shippers aí, envolvendo o motivo da Chloe pintar uma mecha do cabelo de azul - segundo vazamentos de informações nas semanas anteriores, mas o estúdio Deck Nine voltou atrás após uma avalanche de críticas vindas do fandom. O que configura, ao mesmo tempo, um ponto positivo, já que a Deck Nine andou quebrando a canonicidade de Life is Strange (veja todas até o momento aqui), mas afetou a rota de quem escolheu "ALGO MAIS" no episódio de estreia, em detrimento de "AMIZADE" (não há diferenças românticas entre eles).
Em Inferno vazio, descobrimos que a suposta amante de James Amber é, na verdade, a mãe verdadeira de Rachel: Sera, uma viciada em drogas que foi afastada da família poucos meses depois de dar à luz para não prejudicar a vida da filha. Abalada pela verdade, Rachel deseja conhecê-la e, para isso, conta com a ajuda de Chloe. A partir daí, Chloe finalmente deixa de ser sebosa e toma um banho, conclui mais uma matéria do curso de sapatonice ao consertar sua caminhonete, arruma treta com Damon Merrick - o maior traficantão do pedaço, leva uma Rachel esfaqueada pro hospital, reencontra Drew, Steph e Mickey, investiga o escritório do sr. Amber, vai até Sera e leva porrada na cara, numa cena totalmente deus ex-machina em que cortaram boa parte da ação e a deixaram desmaiada.
Além do fato da Rachel ficar de fora mais da metade do episódio, Inferno vazio complementa o fato de que Before the Storm tem um roteiro preguiçoso, conveniente e com muito mais momentos cinemáticos do que de exploração por parte do jogador, além de um clímax fraco, poucos puzzles, um mínimo da mecânica de bate-boca que se fez muito presente no primeiro episódio, e um antagonista pobre.
Eu estava certa de que o jogo estava usando metáforas, como os sonhos da Chloe e peça de teatro, pra enriquecer a narrativa. Quando William fez o seu discurso sobre o fogo ser bonito, mas perigoso, tava na cara que ele estava falando da Rachel. Eu não poderia estar mais enganada. Foi só um desperdício de boas analogias. Já pode enfiar o jogo no brioco, Deck Nine. Três vezes.
O único momento em que há uma sugestão real de que a Rachel não é santa (e ela não é; Rachel foi baseada na personagem Laura Palmer, de Twin Peaks, FOR FUCK'S SAKE) vem em uma cena bizarra envolvendo a Chloe e o Eliot, que se revelou um verdadeiro stalker. Era como se Eliot fosse a voz do fandom que levanta o lado manipulador da Rachel, logo invalidado pelo discurso do próprio jogo de que "é coisa da nossa cabeça". Mais um desperdício narrativo. Os gamers caíram tão bem na rede de sedução dela que talvez nem o Life is Strange original reverta.
Aliás, sobre o Eliot em si, eu não sei ainda qual foi o propósito dele na história. Tive uma forte sensação de que cataram as discussões do fandom sobre Warren ser ou não um stalker da Max e adaptaram pro contexto de Before the Storm, mas... pra quê? Me pareceu algo muito randômico. Quanto aos outros personagens secundários, há consequências interessantes das escolhas feitas anteriormente. Se é o Mickey que leva uma surra no episódio 2, a Chloe tem uma outra oportunidade de jogar RPG no hospital com ele. Já o Nathan tem, se não me engano, três possibilidades de fins diferentes de acordo com o que você conversa com a Samantha nos bastidores do teatro (e que nos levam a pensar como podem ter se desenvolvido seus transtornos mentais). Victoria mal dá as caras. E a Steph, infelizmente, tem pouquíssimo destaque em Inferno vazio.
Já quando penso nos núcleos do Frank e do David, minha cabeça é invadida por questionamentos, um puxando o outro, que envolvem o game num geral:
Pela segunda vez, ele salva o traseiro da Chloe de uma treta fodida. Por algumas vezes, ela manifesta preocupação com ele, principalmente neste episódio, inclusive escrevendo no diário. Não há nada que indique por que em Life is Strange ela é tão arisca com ele, ou por que a relação se tornou tão conturbada. David é uma florzinha em Before the Storm - quem conhecer a franquia primeiro pelo prelúdio vai ter a experiência prejudicada quando chegar no jogo original. Além de ele se mostrar um cara muito mais legal aqui, ao fim do episódio, dependendo se você aceita ou não uma foto de guerra do David, a Chloe reage de maneiras diferentes ao pedido de casamento dele à Joyce
Além do mais, como que um promotor deixa provas de crimes expostas em seu escritório? Como é que o Damon reconhece o celular do James Amber tão fácil? É a porra de um celular, cara, pessoas compartilham do mesmo modelo. Como caralhas a Chloe ACABA de pintar o cabelo e já tá com a raiz exposta? E por que, POR QUE a Chloe parece estar aceitando a morte do pai, se o que vemos em Life is Strange é o contrário?
Isso não faz sentido. Além de cortarem a conexão entre Max e Chloe, fazendo com que Life is Strange e Before the Storm não tenham uma ponte desse assunto - por acaso, o assunto central do primeiro game -, Chloe vive remoendo o passado. Ela está muito mais rebelde. Esse plot não pertence a esse jogo.
Mas, olha, eu me diverti jogando Before the Storm; meus textos anteriores não me deixam mentir. Mas é, sim, um game esquecível. Por mais que parte das pessoas possam esquecer ou deixar de lado a primeira temporada de Life is Strange assim que começam um jogo novo, LiS continua tendo uma história infinitamente mais sólida e completa. Before the Storm, no fim das contas, não foi centrado na vida da Chloe três anos antes, e sim em amberprice (sendo amizade ou não) e num enredo voltado para o mistério da família da Rachel.
A sensação ainda é de uma fanfic; uma visão alternativa do que teria acontecido com as personagens naquela época, mas ainda preciso jogar Life is Strange mais uma vez pra entender como minha percepção sobre a história foi alterada depois desse prelúdio. Ou se não foi. Os momentos mais emocionantes de Before the Storm, pra mim, foram as cenas evolvendo os sonhos com William Price, toda a sequência de quebra-quebra no ferro-velho, o epílogo de Inferno vazio e as ceninhas extras pós-créditos, que me pegaram de surpresa. And guess what? Todas elas têm ligação direta com a primeira temporada de Life is Strange,
Se a Deck Nine tivesse abordado a época próxima da Rachel sumir, tocando em seu envolvimento com o Frank, com o Jefferson e com o Nathan, talvez o jogo ficasse mais interessante.
Agora, é aguardar o episódio bônus que sairá em meados de fevereiro, contando um pouco da infância da Max e da Chloe. Depois desse balanço geral, a ansiedade se aquietou consideravelmente, mas o fato de as dubladoras originais das personagens terem voltado para esse projeto já me deixou imensamente contente. Suspeito que, dessa vez, ficarei mais tocada.