De você, eu tenho os dedos das mãos com as juntas grossas e as unhas redondas. Nos pés, o mesmo formato e tamanho dos dedos, em ordem decrescente (se você contar a partir do dedão). Tenho os mesmo dentes grandes que explodem na boca quando rio de qualquer bobagem na internet, e que não me deixam esquecer nada disso sempre que os vejo refletidos no espelho ao escovar os dentes.
De você, tenho a influência musical nos discos de Alanis, Roxette, Enya e de toda a coleção Lovy Metal (que, de metal, nem tinha tanto assim). Tenho memórias de almoços regados a Bacalhau à Gomes de Sá e pastéis de Belém de sobremesa; memórias de desenhos coloridos, piadas infantis, passeios na praia durante as férias, brigas e reconciliações, de roncos emudecendo os diálogos dos filmes na sala e de como eu fazia esforço pra não andar com os ombros pra frente, enquanto tentava, assustada, entender eu mesma e o que acontecia à minha volta.
De mim, você teria os gestos e as conversas de quem estourou a bolha e teve a consciência de quem é e do mundo em que vive só depois dos 24. Mas, de mim, o que você talvez agora tenha seja uma lembrança bem distante de uma vida da qual eu fazia parte.
O tempo passa, a distância existe, o perdão resiste e o seu sangue vai continuar correndo junto do meu. “Ó Manuela, por que estás tão triste?”, poderiam me perguntar. Eu diria que o que aconteceu foi o medo. Medo que, de você, eu só tenha sonhos daqui pra frente.
Ou pesadelos.
--
Esse post faz parte da blogagem coletiva de setembro do Rotaroots no Facebook, um grupo de blogueiros que quer resgatar um pouco da blogosfera old school.
Ou pesadelos.
--
Esse post faz parte da blogagem coletiva de setembro do Rotaroots no Facebook, um grupo de blogueiros que quer resgatar um pouco da blogosfera old school.